Conto
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Quando começa? Era uma vez… uma história. Não uma historiazeca qualquer!
Não, claro que não! Era uma vez… a minha história. Ai, desculpem lá mas nunca
fui bom como apresentador, por isso peço perdão pela má introdução. Má? Bom,
também não me posso punir desta maneira. Afinal eu sou… bem, quem é que eu sou?
Sim, eu. Quem sou eu? Não vos vou dizer já. Não é que eu goste muito de
suspense, para dizer a verdade prefiro comédias. Comédias: não gostam? Mesmo
que não gostem vão ouvir a minha história para saberem quem sou. Não, não sou
um bicharoco qualquer. ARGH! Que horror. Sou … bem, não sou, fui! Fui e vou
contar como comecei sendo quando fui… o quê?! Não percebi nada. Perceberam? Ai
sim? Ai não? Pelo sim pelo não, vou dizer de outra forma: Era uma vez… lá estou eu outra vez com a mania dos
escritores de criancinhas. Sempre a mesma coisa, a mesma conversa, a começarem
as histórias com "uma donzela, bonita, dotada de todos os bons dons, um
tirano, um nobre, um… rei ou príncipe, vários irmãos ou nenhum, um mordomo,…
coitado, o que apanha sempre com as culpas quando o crime não é descoberto.
Crime? Perguntam bem! Onde é que eu fui buscar o crime? Afinal só estava a
começar a minha história! Que mania, a das pessoas, estarem sempre a fazer
perguntas… assim, a este passo de lesma retardada, nem ao princípio dos
princípios chegamos… Sim, era uma lagarta… mas antes de ser lagarta ainda não
tinha nascido. Não é espantoso? Eu nunca cheguei a perceber como é que se é
nada antes de se ser alguma coisa… Ah! É verdade, a lagarta. Pois sim… Ela nasceu num lindo, humilde, mas não muito rico
buraquinho, pequenino, onde cabia toda a família: o papá, sempre com o seu
cachimbo no canto da boca e a ler o "Insecto-Jornal", que, cá entre
nós, não traz notícias nenhumas de jeito: «Ontem, às 14 horas, junto ao tronco número 4 da ribeira
7…» (sabem ali como quem vai para o riacho 511… sim, esse mesmo) «… um
gafanhoto com o seu jeito saltitão, atropelou uma larvazinha que atravessava
uma erva de um lado ao outro…» - e continua. Não é disparatado? Nem me digam. Sabem, é que o papá está
velho e já não tem nada com que passar o tempo. A mamã, por outro lado, anda
muito moderna. Comprou uma bicicleta de exercícios. Daquelas que, por mais que
se pedale, não sai do mesmo sítio. Todos os dias vai à aula de aeróbica e já
disse que está a pensar em inscrever-se no judo. Nós, claro, tentamos
convencê-la do contrário, que não precisa de se preparar para enfrentar os
ladrões, que nós tratamos deles… O pai não quer que ela vá porque quem não quer
apanhar nas antenas é ele. Por outro lado, eu acho que é semente mal gasta.
Acho que deviam aproveitar e investir, em pôr as sementes a prazo. Talvez daqui
a uns anitos tivéssemos uma ou duas árvores só nossas. Ah, pois não! Está claro
que não! A vida está mal para todos… menos para os ricos. Se soubessem o que o
Mister Libelinha nos cobra por mês, caíam para o lado. Esse também é boa peça.
Andou pelo estrangeiro, onde se ganha mais fazendo menos, passou pelo Japão,
Brasil e agora possui mais de vinte árvores… só dele! E um pequeno hotel ao pé
do rio Cacho… o maior da aldeia! Fora o que tem para o estrangeiro… mas a que
propósito é que aquele snob foi para aqui chamado? Ainda me falta falar da
minha irmã. Sim, é mais novita do que eu. É tão gira! Acho que é a lagarta mais
bonita que já vi… dentro do género, é claro. Porque aparecem umas na televisão,
à noitinha, no programa "Olho no Bicho", que são uma beleza. É no
canal "De Mais". Claro que os meus pais não me deixam ver, mas é que
eles não sabem que o vejo, porque já estão a dormir. Mas eu estava a falar da minha irmã, não é? Pois ela
nasceu há pouco tempo. Deve fazer daqui a alguns minutos cinco horas. Mas a
verdade é que eu não gosto nada de crianças. Não sei, estão sempre com caras
parvas, a olhar para o mundo e a chuchar naquela coisa horrível. Quando eu era
pequeno, dizem os meus pais, era a lagarta mais gira das redondezas. E olhe que
não é para me gabar, mas eu acho que eles têm razão. [...] Andei, claro que andei! Eu não sou nenhum analfabeto.
Chama-se "Escola do Insectozinho Sábio". Tinha aulas de português,
francês, inglês, matemática, história de encantar, ciências da bicharada e até
nem era mau aluno, não senhor. Mas com aquela idade o que eu gostava de ser, quando
fosse grande, era advogado. [...] Ah pois ganham! Muito bem até. E essa ideia não me largou
até entrar para a "Escola do Sá Bichão", que é a escola para onde vão
os bichinhos quando já são mais… espertos! Eu fui e pude escolher as minhas
disciplinas preferidas que eram as línguas e a matemática… não, claro que não,
que disparate! Eu não andava nas más línguas; eu tinha era aulas que me
ensinavam a falar melhor. Eu nunca fui muito lagartendo, não senhor. Uma vez
apaixonei-me por uma. Era linda: a mais bonita do liceu. Mas ela nem sabia que
eu existia. Pretendentes não lhe faltavam. Tinha-os à farta. Mas ela foi
escolher o pior deles todos: o maior. Acredito mesmo que todos os dias ele vá
para o quarto perguntar ao seu bastão de flyball: bastãozinho, bastão meu,
existe no mundo, ou pelo menos nesta escola, insecto melhor que eu? O bastão
diz que não. Não me admiro nada que ele dê com o bastão no primeiro que o
contradiga e fique a dormir para sempre… bem, para sempre não. Só até que
apareça uma abelha e lhe dê um beijo e vivam felizes até ao fim… o tal
"final feliz" das histórias de encantar. Lagarto, lagarto, lagarto!
Dessas histórias fujo eu. Não gosto, não são reais, não existem. Como é que se
pode imaginar que exista felicidade plena, completa? Ninguém é feliz a tal
ponto. Comigo as coisas passam-se naturalmente. Sabem, já pensei
em ser actor. Sim actor. Estão a rir-se? não tem graça nenhuma, eu estou a
falar a sério. Sim, a sério. O que eu queria fazer era teatro, para começar, é
claro. Ouvi dizer que estão a precisar de actores no Teatro Asa Dela para uma
tragédia. Não suporto. Não suporto mesmo. De trágico já me chega a vida. Agora
imaginem-me a fazer o papel principal numa peça policial... Um zangão rico tinha duas filhas lindas. Sim, ambas
lindas. Claro que tinham de ser as duas porque eram gémeas. O Zato era
orgulhoso das suas duas filhas e era também muito, mesmo muito rico. Tão rico
que ninguém imaginava a quantidade de mel que tinha. Risa era a sua rainha:
trabalhava para ele, como todas as abelhas rainhas: fazia todo o trabalho na
colmeia. Zato pagava-lhe pelo serviço: "tão pouco!". Sim, era pouco,
uma miséria. Mas o que é que isso lhe interessava? Ela admirava-o, tinha-lhe
respeito, era o zangão máximo, ela amava-o. Ninguém sabia. Só ela. O que os
outros pensavam era que ela queria ser a rainha-dona da grande colmeia. Sila e Lasi eram as filhas de ambos. Sila era adorável e
Lasi era… detestável. Bom, nem tanto. Pode dizer-se que ela era a menina “bem”,
cheia de peneiras. Zono era o secretário-mor de Zato: vivia pregado a ele: - Zono eu quero… - dizia Zato. - Sim, imediatamente… - cumpria Zono. -Talvez se nós… -tornava Zato. - Mas, claro… - concordava Zono. - Nunca! Como é que… - Claro, claro. Como?… - novamente. - Temos de.. - continuava Zato. - Imediatamente… - outra vez Zono. - Talvez… - Zato. - Porque não? Tem razão… óbviamente… - como é óbvio:
Zono. Sempre assim. Claro que por detrás de toda esta lealdade
havia gato. Ou Zato? Ninguém desconfiava. Zato, devido a toda esta confiança e
lealdade, e tal como a sua mulher e suas filhas, havia incluído Zono no seu
testamento, atribuindo-lhe parte, ainda que uma pequena parte, da grande
riqueza. o que se tornava em muito. A juntar a este elenco vinha outra personagem: Miss Libas
- amante de Zato e que se encontrava com ele às escondidas. Criados (quase todos) os ingredientes para se fazer uma
pequena peça de teatro, dá-se então inicio ao espectáculo. É então que começa o
primeiro acto. Abelha ou azelha? Zummmm! Ouve-se este estranho ruído. A colmeia parece um
centro comercial, com tanto insecto a correr não se sabe para onde. Às páginas
tantas, uma das salas da presidência da colmeia é centrada de atenções dos
passeantes curiosos. Um inspector, o Sr. Zunas, tenta, com a ajuda de duas
moscas polícia, afastar aquela enchente. O detective é contactado não se sabe
por quem e aparece no local onde não tinha sido chamado. No entanto, o seu
instinto de detective diz-lhe que se devia meter. Está-se logo a ver quem era
esta personagem inteligente, charmosa, sexy, linda, maravilhosa… o personagem
principal. Ah, não se está logo a ver quem é? Claro que não é o Teimas Cruzado.
Sou eu! É! Eu! Pois! Lá ia eu a entrar no gabinete do presidente - o gabinete
de Zato. Claro que assim que lá entrei me apercebi do que se estava a passar:
tinha acontecido um insecticídio. O milionário tinha sido assassinado. E o
assassino quem seria? A esta pergunta, o grande mistério, só um insecto no
mundo (será?) podia responder: Zato. Para resolver, indubitavelmente só um: eu.
Comecei logo por recolher dados e a investigar. Quem não gostou nada da
coscuvilhice foi o inspector, que disse logo que era ele que resolveria o
crime. Eu não dei ouvidos e prossegui com as investigações. Ele parou de me
azucrinar as antenas e foi no seu caminho. Entretanto soube que o facto havia ocorrido há meia hora,
ou seja, às 16H45. Zato foi morto por um ferrão de abellha muito afiado. Ao
lado do corpo do zangão fluía uma pequena mancha que analisei de imediato e
rapidamente pude dizer: isto é mel. Realmente eu tinha duas pistas. O assassino
possuia uma "pressora de ferrão" com a qual tinha morto Zato. O
assassino tinha também acesso ao mel real da colmeia, por isso o leque dos
suspeitos estava reduzido ao número de abelhas com permissão no recinto. Entretanto uma abelha zumbe pela sala desatando a chorar.
Era bela! Nunca tinha visto beleza tão incomum: pele sedosa, asas de princesa
e… até tinha uma coroa na cabeça. Após a sua esvoaçante entrada outra igual
figura apareceu. Eu pensei que estava, não bebedo, porque não o faço em serviço
(ou fora dele), mas a sonhar. Não
estaria a sonhar? Duas? Iguais? Não é possível, pensei. Sim: iguaizinhas e à
minha frente. Só a primeira estava a chorar, perante o corpo jazido no chão,
ainda com o ferrão espetado no peito. A segunda limitou-se a olhá-lo: - Podia ter sido muito pior, meu pai - balbuciou, quase
em surdina mas não deixei de ouvir, com o ouvido astuto que tenho. As palavras saiam, no entanto, geladas mas por outro lado
verdadeiras no tom. Zato, o rei, era pai das duas criaturas, quero dizer,
princesas, Sila e Lasi. Sila chorava ainda, enquanto dois mosquitos enfermeiros
tapavam o corpo do defunto e o metiam na ambulância, num ritual quase habitual
a que respondiam gestos quase programados. Lasi, frívola e aparentemente
intacta à morte do pai, desapareceu do local quase sem eu dar por isso. Eu sabia que tinha de interrogar as meninas para
continuar o processo e talvez encontrar mais pistas. Todas ajudam, nesta
profissão. Aquele não era o momento e guardei para mais logo o interrogatório.
Fui à procura de dados noutras paragens. Havia o secretário-mor e a rainha,
ambos trabalhadores de Zato. Tinha de começar por alguém, por isso dei primazia
à alteza. Apresentados que fomos, gentilmente me recebeu na sala do
trono onde, espantosamente, soube que morava sozinha… - Eu gostava muito do Zato. - Gostava? Como assim? - desconfiei eu. - Pois, gostava. Já não gosto… quero dizer… ele morreu,
não foi? Boa resposta. Para não me desmanchar, lancei: - Eu queria dizer, gostava como? De que modo? - Ah… eu… sabe… sou um bocado tímida - deu para perceber
- apesar de ser rainha e de ser considerada uma sex symbol pelos garotos
zangões… - disse embaraçada a rainha. - Mas isso não vem ao caso. Sei, por fontes seguras, que
o seu salário na colmeia é miserável: o sr Zato dava-lhe praticamente… nada.
Nicles! Ele só lhe dava quatro frascos de compota de frutos secos. Qual era o
motivo que a levou a trabalhar tantos anos com este… este… miserável? - Miserável não! Eu amava-o… Apesar de não querer acreditar, soava a verdade. Como não
posso acreditar só nos meus sentidos mas em factos… - O quê? Você disse… - Sim, foi o que ouviu: eu amava-o. E continuaria a
ama-lo até ao fim da vida… - Áhá! Até ao fim da vida "dele", não é assim?
Porque depois de morto quem passaria a reinar na colmeia era você, não é?
Confesse… - Não! Posso ser tímida mas não sou louca. Era louca mas
por ele e a verdade é esta: eu amava Zato sem pedir nada em troca… isso é
amor…e agora, se não se importa, se já acabou com as acusações, eu vou-me… - Só um momento: onde é que estava hoje por volta das
16H30, 16H45… - Onde, senão no meu trono, poderia eu estar? Não posso
largá-lo, sou a única que cria as jovens abelhas. - Está muito bem, muito obrigado. Agradeci enquanto me acompanhou até à saída. Abandonei a
sala do trono e antes de fechar a porta dei uma última olhada para a bela
rainha, que chorava duas gotas brilhantes a que se dá o nome de lágrimas.
Injustamente, porque aquelas duas gotas eram duas pérolas resplandecentes. Por
momentos tive pena da Risa. Mas este pensamento foi derrubado pelo meu ofício
que não permitia tal sentimento. Por isso, tomei nota do seu depoimento, sem
olhar, por enquanto, a se tal era ou não verdade. Parti para outra. Ou melhor,
outro: o segundo suspeito. Zono assumia o cargo de secretário-mor. - Qual era a sua função junto a Zato? - comecei. - Bem, eu… era… como um amigo intimo, confidente do Sr.
Zato. - Como assim? Não era um trabalho profissional? -Claro… mas não havia lugar onde o sr Zato fosse, que eu
não estivesse com ele. - Era um fita-colas… - murmurei - Um quê? Não percebi… Não ouviu, foi o que foi. Nem era para ouvir. Disfarcei,
quase atrapalhado: - Um amigolas. - Isso sim, talvez… é, pode ser: um amigolas. - Mas qual a verdadeira razão que o levava a tal
lealdade? Pelo que sei do cargo que você ocupa não se tira grande partido… ou
estou enganado? Ainda não acabou! Completa este Conto! Se o teu final for o mais
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